Nenhum dos oficiais de alta patente antecipa tranquilidade e estabilidade pela frente
William Waack, O Estado de S.Paulo
06 Setembro 2018 | 05h00
A coluna é dedicada ao que pensam os militares sobre o momento
político. Condensei mais de dezena de longas conversas recentes com oficiais de
alta patente das três armas, quase todos da ativa, incluindo dois comandantes.
Oficiais generais não manifestam qualquer disposição para a tal “intervenção”
militar. Mas se perguntam, sem conseguir responder, o que fazer se houver
rompimento de um tecido social já “esgarçado” (expressão muito usada por eles).
O cenário mais temido é a quebra de lei e ordem “no caso de uma besteira
qualquer do STF beneficiando o Lula” ou, pior, da reconhecida falta de
contingentes para atuar no caso de greves de PMs ou a paralisação do País por
bloqueios simultâneos de rodovias.
“Achamos que devemos, sim, alertar em público e em privado
para perigos e chamar à razão pessoas com responsabilidades”, diz um
interlocutor. Assim foi entendido, por exemplo, o já célebre tuíte do
comandante do Exército às vésperas do julgamento de um habeas corpus em favor
de Lula, em abril. Oficiais registraram com alívio sinais, vindos de contatos
diretos com integrantes do STF, de que “não haveria surpresas” até o fim do
período eleitoral, o que inclui questões envolvendo a Lei da Anistia, um ponto
descrito como inegociável – boa parte dessa sensação vem da indicação do
general Fernando Azevedo e Silva, até agora no comando do Estado-Maior do
Exército, como assessor do ministro Dias Toffoli, que assume a presidência do
STF. Esse oficial é uma das principais “cabeças políticas” nas três armas.
Esse “chamado à razão” – na verdade, um alerta e uma
advertência – resulta menos de um cálculo para interferir na política e mais
para “aliviar enorme pressão” vinda de escalões inferiores nas estruturas de
comando. “Você imagine que um maluco de saco cheio com a política comande um
pequeno destacamento bloqueando algum lugar – digamos, Curitiba – e aí ninguém
segura mais nada”, admite-se, por hipótese. “A fragilidade do atual governo é
um absurdo, e a falta de autoridade também”, comenta-se. “Não dá pra achar que
a gente vai salvar políticos incompetentes desse desastre.”
Oficiais de alta patente já admitem a possibilidade de um
presidente Jair Bolsonaro (“para nós não é mais capitão, é um político civil”),
em relação a quem não mais se declaram refratários, embora lhe atribuam escassa
sabedoria política e pouca capacidade de articulação para enfrentar um
Congresso provavelmente hostil. “Ponto positivo nele é que talvez ajude a frear
essa onda de esquerdização do País”, diz fonte de alta patente. “Já conseguiu
encurralar parte dessa mídia que é a grande responsável por esse clima.”
O general Heleno é um dos principais canais entre Bolsonaro
e setores superiores da ativa, em que se ouve o palpite de que “Bolsonaro daria
um tiro certo se nomeasse o Heleno seu chefe da Casa Civil, pois tem cabeça
política melhor que a dele, e se pusesse um civil no Ministério da Defesa”,
disse um general de destaque.
Nenhum dos oficiais de alta patente antecipa tranquilidade e
estabilidade pela frente. Acham que há um esforço internacional, incentivado
também pelo PT, de enfraquecer “ainda mais a soberania nacional”, lamentam que
debates sobre segurança e um projeto de País mal apareçam na campanha,
queixam-se de que não há como soldados resolverem questões de ordem pública,
manifestam-se profundamente descrentes da classe política, mas, também, do
Judiciário ser capaz de reverter a onda de insegurança jurídica (que, apontam,
vem de um STF fracionado por lealdades políticas e pessoais de todo tipo).
Não se furtam a fazer comparações com “a bagunça” que
precedeu 1964, mas não é a que se poderia esperar (intervir para “salvar a
democracia”, por exemplo). “Naquela época, pelo menos, havia estadistas”, disse
um destacado oficial general. “Hoje, este país é um deserto de lideranças.”
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