Coronavírus: A União Europeia está Ruindo

De algumas semanas para cá, os Estados Membros da UE fecharam suas fronteiras, proibiram as exportações de suprimentos essenciais e contiveram a ajuda humanitária. Foto: congestionamento de caminhões na estrada que leva à passagem de fronteira entre a Áustria e a Hungria perto de Nickelsdorf, Áustria em 18 de março de 2020. (Foto: Thomas Kronsteiner/Getty Images)

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  • Diante de uma ameaça existencial, os Estados Membros da UE, longe de juntarem forças para enfrentarem a pandemia como bloco coeso, estão instintivamente se voltando ao interesse nacional. Após anos de críticas ao presidente dos EUA, Donald J. Trump, por promover a política do "América em primeiro lugar", os líderes europeus estão revertendo àquele nacionalismo que tanto abominaram publicamente.
  • Desde que a ameaça representada pelo coronavírus virou o centro das atenções, os europeus mostraram muito pouco da altiva solidariedade multilateral que por décadas fizeram crer ao restante do planeta ser o baluarte da unidade europeia. A singular marca de soft power da UE, considerada modelo para a ordem mundial pós-nacional, mostrou ser nada mais do que uma utopia.
  • De algumas semanas para cá, os Estados Membros da UE fecharam suas fronteiras, proibiram as exportações de suprimentos essenciais e contiveram a ajuda humanitária. O Banco Central Europeu, garantidor da moeda única europeia, tratou com menosprezo sem precedentes a terceira maior economia da zona do euro, a Itália, no singular momento de necessidade. Aos Estados Membros mais castigados pela pandemia, Itália e Espanha, foram dadas as costas pelos demais Estados Membros.
À medida que a pandemia do coronavírus avança a todo vapor pela Europa, onde mais de 250 mil pessoas já foram diagnosticadas com a doença do Coronavírus 2019 (COVID-19) e 15 mil morreram, os principais pilares da União Europeia estão ruindo, um a um.

Diante de uma ameaça existencial, os Estados Membros da UE, longe de juntarem forças para enfrentarem a pandemia como bloco coeso, estão instintivamente se voltando ao interesse nacional. Após anos de críticas ao presidente dos EUA, Donald J. Trump, por promover a política do "América em primeiro lugar", os líderes europeus estão revertendo àquele nacionalismo que tanto abominaram publicamente.

Desde que a ameaça representada pelo coronavírus virou o centro das atenções, os europeus mostraram muito pouco da altiva solidariedade multilateral que por décadas fizeram crer ao restante do planeta ser o baluarte da unidade europeia. A singular marca de soft power da UE, considerada modelo para a ordem mundial pós-nacional, mostrou ser nada mais do que uma utopia.

De algumas semanas para cá, os Estados Membros da UE fecharam suas fronteiras, proibiram as exportações de suprimentos essenciais e contiveram a ajuda humanitária. O Banco Central Europeu, garantidor da moeda única europeia, tratou com menosprezo sem precedentes a terceira maior economia da zona do euro, a Itália, no singular momento de necessidade. Aos Estados Membros mais castigados pela pandemia, Itália e Espanha, foram dadas as costas pelos demais Estados Membros.

As sementes da União Europeia foram plantadas sobre as cinzas da Segunda Guerra Mundial. Em maio de 1949, Robert Schuman, um dos fundadores da UE, arrojadamente anunciou a criação de um novo sistema mundial:
"estamos fazendo um grande experimento, a realização do recorrente sonho que de dez séculos para cá vem revisitando os povos da Europa: a criação de uma organização para por um fim à guerra e que garanta a paz eterna".
A União Europeia, que se encontra há sete décadas em processo de formação, está caindo pelas tabelas em tempo real, isso em poucas semanas. É praticamente certo que depois da poeira da pandemia de coronavírus baixar, as instituições da UE continuarão a atuar como antes. Muito capital político e econômico foi investido no projeto europeu para que as elites europeias façam o contrário. No entanto, a sedução da UE como modelo pós-nacional para seus cidadãos, muito menos para o restante do mundo, serão águas passadas.

Exemplos recentes da busca unilateral do interesse nacional por líderes europeus, muitos dos quais defendem publicamente o globalismo, na hora da onça beber água abraçam o nacionalismo:
  • França, 3 de março. A França confiscou todas as máscaras de proteção fabricadas no país. "Vamos distribuí-las aos profissionais de saúde e aos franceses acometidos pelo coronavírus", escreveu o presidente francês Emmanuel Macron no Twitter. Em 6 de março, o governo francês forçou a Valmy SAS, fabricante de máscaras, perto de Lyon, a cancelar um pedido de milhões de máscaras do Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido.
  • Alemanha, 4 de março. A Alemanha proibiu a exportação de equipamentos médicos de proteção e hospitalares, como óculos de segurança, respiradores, jalecos de proteção, roupas e luvas de proteção. Em 7 de março, o jornal suíço Neue Zürcher Zeitung publicou que funcionários da alfândega alemã estavam impedindo que um caminhão suíço com 240 mil máscaras de proteção retornasse à Suíça, país não membro da UE. O governo suíço chamou o embaixador alemão para protestar contra a proibição de exportação. "Na conversa, segundo consta, as autoridades alemãs foram imediatamente instadas a liberar os produtos", salientou um porta-voz do governo suíço. Após a reação adversa de outros Estados Membros da UE, em 19 de março a Alemanha voltou atrás e levantou a suspensão da exportação.
  • Áustria, 10 de março. A Áustria se tornou o primeiro país da UE a fechar as fronteiras com outro país da UE. O Chanceler Sebastian Kurz anunciou a criação de postos de controle ao longo da fronteira com a Itália além da proibição de entrada da maioria dos visitantes daquele país. "A prioridade nº 1", ressaltou Kurz, "é impedir a propagação do coronavírus, não trazer a doença para nossa sociedade. Portanto, há uma proibição de entrada de pessoas da Itália na Áustria, com exceção das que possuem um atestado médico certificando que estão saudáveis." O governo também anunciou a proibição de todas as viagens aéreas e ferroviárias para a Itália. A decisão da Áustria ameaça jogar por terra o assim chamado Espaço Schengen, que entrou em vigor em 1995 e aboliu a necessidade de passaportes e outros tipos de controle nas fronteiras de países vizinhos de 26 países europeus.
  • Eslovênia, 11 de março. O governo fechou algumas passagens de fronteira com a Itália e as que ainda permanecem abertas estão fazendo checkups para combater a propagação do vírus.
  • República Tcheca, 12 de março. O Primeiro Ministro Andrej Babiš fechou as fronteiras do país com a Alemanha e a Áustria e proibiu a entrada de estrangeiros vindos de outros países que apresentam risco. Em 22 de março, o governo salientou que as restrições de fronteira poderão durar até dois anos.
  • Suíça, 13 de março. O governo suíço impôs controle de fronteiras com outros países europeus. A Suíça, embora não seja membro da União Europeia, faz parte da Zona Schengen.
  • Itália, 13 de março. A Presidente do Banco Central Europeu, Christine Lagarde rejeitou pedidos de assistência financeira da Itália para ajudar o país a lidar com a pandemia. Depois que seus comentários abalaram os mercados financeiros, Lagarde ressaltou que o BCE estava "totalmente comprometido em evitar qualquer fragmentação em um momento difícil para a zona do euro". O presidente italiano Sergio Mattarella respondeu que a Itália tinha o direito de contar com a solidariedade e não com obstáculos vindos do outro lado de suas fronteiras.
  • Dinamarca, 14 de março. A Primeira Ministra Mette Frederiksen impôs controle de fronteiras abrangendo todo tráfego terrestre, marítimo e aéreo até pelo menos 13 de abril.
  • Polônia, 15 de março. O governo fechou as fronteiras do país para todos, exceto cidadãos poloneses e pessoas com vistos de residência.
  • Alemanha, 16 de março. A Alemanha, o maior e mais poderoso país da União Europeia, impôs controle de fronteiras com a Áustria, Dinamarca, França, Luxemburgo e Suíça. A medida foi tomada depois que a Alemanha registrou mil novos casos de COVID-19 em um só dia.
  • Hungria, 16 de março. O Primeiro Ministro Viktor Orbán suspendeu todo o tráfego de passageiros com destino à Hungria, somente cidadãos húngaros poderão entrar no país.
  • Espanha, 16 de março. O Ministro do Interior Fernando Grande-Marlaska decretou a construção de controle de fronteiras em todas as fronteiras terrestres.
  • Sérvia, 16 de março. O Presidente Aleksandar Vučić declarou estado de emergência por conta do coronavírus. Ele condenou a UE por restringir as exportações de equipamentos médicos e hospitalares e pediu a ajuda de seu "amigo e irmão", o líder chinês Xi Jinping. "A solidariedade europeia não existe", assinalou Vučić. "Isso foi um conto de fadas que vale somente na teoria e não na prática. Enviei uma carta singular ao único país que pode ajudar, no caso a China". A Sérvia requisitou se tornar membro da UE em 2009. As negociações sobre a adesão começaram em janeiro de 2014.
  • República Tcheca, 17 de março. As autoridades tchecas confiscaram 110 mil máscaras que a China enviou para a Itália. Em 23 de março, a República Tcheca entregou o material confiscado à Itália. "Há 110 mil máscaras a bordo do ônibus a título de presente para a Itália, que deveria substituir o material que provavelmente era um presente chinês aos compatriotas italianos", assinalou a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores Zuzana Stichova.
  • Alemanha, 18 de março. A Chanceler Angela Merkel, em um raro pronunciamento transmitido pela TV, urgiu todos os alemães a obedecerem as determinações destinadas a reduzir o contato social direto e evitar ao máximo o número de novas infecções. "É sério", realçou ela. "Levem isso a sério. Desde a reunificação alemã, na verdade, desde a Segunda Guerra Mundial, nosso país nunca enfrentou um desafio no qual a solidariedade fosse tão crucial". Esta foi a primeira vez que Merkel se dirigiu à nação em quase 15 anos no cargo, fora o discurso anual de Ano Novo. Ela não mencionou a União Europeia nem os demais Estados Membros da UE.
  • Bélgica, 22 de março. O coronavírus acirrou os ânimos entre a Bélgica, que está em quarentena e a Holanda, que não a instituiu. "Na Holanda as lojas ainda estão abertas e aglomerações de até 100 pessoas ainda são permitidas, são verdadeiros criadouros do vírus", adiantou Marino Keulen, prefeito da cidade fronteiriça belga de Lanaken. As autoridades belgas montaram barricadas ao longo da fronteira e orientam os carros com placas holandesas a fazerem meia volta e retornarem para casa. Keulen classificou o controle de fronteiras um "alerta para Haia" para que "apareça logo" com uma resposta e se alinhe aos países vizinhos. "O governo holandês é incompetente e ridículo no tocante à resposta à crise do coronavírus" salientou Leopold Lippens, prefeito da cidade litorânea belga de Knokke-Heist. "A Holanda não está fazendo nada, de modo que temos que nos proteger por conta própria."
  • Espanha, 25 de março. Por não ter conseguido obter ajuda da União Europeia, o governo espanhol pediu à OTAN que a ajudasse a adquirir 1,5 milhão de máscaras e 450 mil respiradores. A OTAN carece desse material e na melhor das hipóteses pode passar o pedido da Espanha aos demais 29 aliados, muitos dos quais também são membros da UE.
  • Polônia, 25 de março. Autoridades polonesas impediram que centenas de milhares de frascos de álcool em gel fossem exportados para a Noruega, país que não é membro da UE. A empresa norueguesa Norenco fabrica e empacota frascos de álcool em gel para o mercado escandinavo em uma de suas fábricas na Polônia. O presidente da Norenco, Arne Haukland, disse que depois de solicitar uma licença de exportação, cinco homens foram à fábrica e exigiram verificar o estoque de frascos de álcool em gel. Ele disse então que a empresa recebeu uma notificação para que vendesse todo estoque que havia produzido às autoridades locais da cidade em Lubin a um preço fixo, conforme as leis de emergência no tocante ao coronavírus aprovadas na Polônia no início de março. O confisco agravará o problema de suprimento enfrentado pelos hospitais noruegueses.
  • França, 25 de março. O Presidente Emmanuel Macron em um discurso à nação em um hospital militar na cidade de Mulhouse, que foi fortemente atingida pelo coronavírus, conclamou a união nacional e não a unidade europeia: "quando entramos em guerra, entramos com tudo, nos mobilizamos em uníssono. Vejo em nosso país fatores de divisão, dúvidas, todos aqueles que querem fragmentar o país quando é necessário ter somente uma obsessão: estarmos unidos no combate ao vírus. Peço essa unidade e esse compromisso".
Nesse ínterim, na Itália, uma pesquisa de opinião realizada em todo território nacional publicada em 18 de março constatou que 88% dos italianos acreditam que a UE não está ajudando seu país. Apenas 4% acham o contrário e 8% não responderam. Mais de dois terços (67%) dos italianos acreditam que fazer parte da União Europeia é desvantajoso para o seu país.
Em um artigo intitulado "Coronavírus Ameaça a Unidade Europeia", Bill Wirtz, analista político de Luxemburgo, observa:
"À medida que o surto do coronavírus avança, os países do Espaço Schengen vão fechando suas fronteiras. Seja porque acreditam que uma resposta europeia coordenada seria ineficiente, seja porque acreditam que seus próprios eleitores não iriam cair nessa, isso a esta altura é irrelevante. O simples fato de que as fronteiras ressurgiram na Europa mostra o fracasso do princípio do acordo de fronteiras abertas de Schengen."
"Não há uma resposta coordenada da UE à crise e uma vez que as recomendações caem no vazio, Bruxelas se debate com uma crise de confiança. Não há resposta à crise que abranja toda a União, nem na coordenação de testes nem nas pesquisas. Pior do que isso, as instituições da UE são meras espectadoras impotentes numa guerra entre países, que procuram limitar as exportações de suprimentos médicos para tê-los para si. Em tempos de crise, esta é a verdadeira influência e competência que a UE mostra, extremamente tímida."
"Do jeito que as coisas estão, os países estão lidando com uma crise de leitos hospitalares, equipamentos médicos e hospitalares e falta generalizada de recursos. Se um dia o surto virótico amainar e se chegar à conclusão de que a União Europeia foi uma mera espectadora impotente no olho do furacão (que é), então o Acordo de Schengen e as fronteiras abertas da Europa estarão diante de uma recuperação complicadíssima".
Darren McCaffrey, editor político do canal de notícias Euronews da França, escreveu:
"Nas duas últimas semanas a solidariedade do bloco entrou em colapso. Os países começaram a impor controle de fronteiras aos países vizinhos da UE e até a Alemanha tomou medidas para manejar o fluxo de pessoas que entram e saem de seu território."
"Na terça-feira, uma fila de 35 quilômetros de extensão se formou na fronteira entre a Polônia e a Alemanha onde centenas de europeus, letões, estonianos e lituanos ficaram presos em seus caminhões, carros e ônibus."
"À medida que a União Europeia precisa tomar medidas para impedir a propagação da doença, muitos temem pela essência da União Europeia e suas quatro liberdades (livre circulação de mercadorias, serviços, capitais e pessoas)."
"De que vale a UE se seus cidadãos não podem circular livremente? De que vale o mercado único se as mercadorias não podem atravessar as fronteiras da Europa sem obstáculos?"
Em um artigo intitulado "Nações em Primeiro Lugar: A UE se Debate pela sua Relevância na Luta contra o Coronavírus", a revista alemã Der Spiegel observa:
"À medida que a pandemia ganha terreno na Europa, décadas de união expõem seus pontos fracos. Enquanto a UE deu um jeito de sobreviver ao Brexit e à crise do euro, a crise do corona ainda pode mostrar ser um desafio intransponível."
"Em vez de procurar soluções conjuntas, o Continente está se balcanizando e voltando às soluções nacionais. Em vez de ajudarem uns aos outros, os países da UE estão estocando máscaras, assim como os europeus em pânico estão estocando papel higiênico. As primeiras decisões tomadas por alguns Estados Membros da UE, que se abstiveram de exportar equipamentos médicos e hospitalares para a Itália, o país da UE que foi até agora o mais castigado pela pandemia, eclipsaram até a falta de solidariedade europeia demonstrada pelo primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, na crise dos refugiados."
 "Os europeus estão divididos até na questão de como combater o vírus. De um lado a Alemanha, ávida ao máximo para que o menor número de pessoas seja infectada pelo vírus, do outro a Holanda quer ver o maior número possível de pessoas saudáveis combatendo o COVID-19 e se tornarem imunes. O indício é claro: na hora do vamos ver, todos os Estados Membros só olham para o próprio umbigo, mesmo 60 anos após a fundação da comunidade".
Soeren Kern é colaborador sênior do Gatestone Institute sediado em Nova Iorque.




https://pt.gatestoneinstitute.org/15820/coronavirus-uniao-europeia-ruindo

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