Está de volta o velho jeito de fazer política. E a velha mídia está encantada
Ana Paula Henkel
No último dia 20, Donald Trump despediu-se do Salão Oval. Finalmente, depois de 47 anos pelos corredores de Washington, Joe Biden entrou na Casa Branca como o presidente da nação mais poderosa do mundo. Mas não fez isso sozinho. Com ele, também entrou a velha política de compadrio dos grandes caciques dos dois grandes partidos americanos. A posse do democrata aconteceu sem o povo nas ruas, que estavam lotadas com mais soldados do que os que compõem as atuais tropas no Oriente Médio e no Afeganistão. E por falar em guerras, até o ex-presidente republicano George W. Bush, senhor de muitas guerras, usando uma gravata azul, cor do Partido Democrata, marcou presença na posse daquele que, segundo a velha mídia, foi o presidente mais votado da história americana. Depois de quatro anos tentando derrubar um outsider, parece que a velha mídia está, novamente, feliz com a volta da velha Casa Branca.
As milhares de bandeiras
norte-americanas e de vários Estados que cobriam o enorme gramado que vai do
prédio do Capitólio até o Memorial George Washington nem de longe pareciam compor
o cenário de um retrato da América vibrante, colorida e barulhenta que vemos em
posses presidenciais. Para o evento que empossou o segundo presidente católico
dos EUA, os eleitores podiam contribuir (apenas os vivos) comprando uma
bandeira para ser colocada no gramado. A doação, já que Biden é homem de fé,
seria enviada para a Planned Parenthood, as clínicas de aborto espalhadas por
todo o país, encontradas principalmente em bairros pobres e nas comunidades
negras (nem todas as vidas negras importam…). O silêncio era fúnebre e a única
cor que se misturava com as árvores no dia frio de inverno na capital era o
mesmo verde dos uniformes dos soldados Guarda Nacional Americana.
Mas isso não importa. A velha mídia não viu nada disso e seguiu como tem seguido. Cega. Em um transe bizarro, todos os canais repetiam, como se tivesse sido imposto por algum ditador, que tudo estava lindo e poético. Até as palavras eram iguais. Lady Gaga cantou o hino nacional e, em suas últimas estrofes, encheu o peito, abriu os braços no melhor estilo Eva Peron, e apontou para o nada, já que a população estava em casa de máscara e em lockdown: “O’er the land of the free and the home of the brave!”. Já no encerramento, a imagem sobrevoava as bandeiras no vasto espaço e tivemos de ouvir o comentarista de uma grande rede de TV dizer que “as luzes refletidas por toda a extensão do gramado pareciam os braços de Joe Biden abraçando Washington”.
Meu Deus. Não conseguimos
conter a risada em casa. Eu poderia usar alguma frase mais elaborada que
reflita o estado atual da velha mídia, mas a verdade, nua e crua, é que a velha
mídia perdeu qualquer resquício do senso de ridículo. Chris Wallace, jornalista
renomado que mediou um dos debates entre Trump e Biden e cobre a Presidência
desde a década de 1960, disse, em tom emocionado, que “nunca, nunca havia visto
um discurso tão maravilhoso na vida”. JFK? Reagan? Obama? Nada disso. Joseph
Biden, além de ser o presidente mais votado da história dos EUA, também fez o
discurso mais impactante de todos os tempos.
Será que a mídia sempre foi
assim, mas, como antes não tínhamos o poder da informação na palma de nossas
mãos, como ainda éramos agentes verificadores de tanta bobagem dita, toda essa
patacoada passava sem que pudéssemos perceber quanto fomos ludibriados pelo
clube da pós-verdade?
Não é preciso uma leitura mais
aprofundada para ver o óbvio. Depois de um ano inteiro repetindo atrocidades no
meio de uma pandemia histórica (tudo “em nome da ciência”), depois de um papel
vergonhoso durante uma campanha presidencial norte-americana, quando, em
conluio com as Big Techs, esconderam a sujeira da família Biden com a China,
chegou a hora de vermos o show demagogo diário da velha mídia com a velha Casa
Branca.
A antiga mídia não existe
mais. Desapareceu aquela imprensa investigativa de Watergate, que acabou
forçando Richard Nixon a renunciar. Ou do famoso caso conhecido como Pentagon
Papers, em que foram expostos documentos do Pentágono que demonstravam,
entre outras coisas, que a administração de Lyndon Johnson havia mentido
sistematicamente sobre a guerra do Vietnã, não apenas para o público, mas
também para o Congresso. E bastou apenas um dia da administração Biden/Harris —
um dia apenas — para suspeitarmos do que vem pela frente.
Em suas primeiras falas à imprensa
como vice-presidente, Kamala Harris foi entrevistada por uma grande rede de TV
norte-americana e, diferentemente de Candace Owens, ativista negra conservadora
e casada com um homem branco, Harris não foi devorada pela cultura do
cancelamento por esse motivo. Ao contrário de Owens, a primeira mulher negra na
vice-presidência, também casada com um homem branco, foi celebrada pela “bela
família multirracial”. A ex-senadora, que durante as primárias democratas
acusou Joe Biden de racismo, foi bombardeada por perguntas muito difíceis
sobre… moda e sapatos. Sim, no meio de uma pandemia histórica, com a China
querendo engolir tudo o que puder nos Estados Unidos e no mundo, moda e sapatos
foram os temas abordados entre gargalhadas da entrevistada e da entrevistadora.
Nada, nem um tiquinho, sobre política doméstica, covid, economia
norte-americana em colapso nos Estados democratas que empregaram o lockdown severo,
ou sequer sobre, segundo a própria Harris, o “racista” Joe Biden ou as
acusações de assédio sexual por parte de uma antiga secretária, Tara Reid. Na
época das primárias democratas, Harris declarou que acreditava em Reid antes de
qualquer coisa. Acusações como essas empurradas para debaixo do tapete pela
velha mídia, para proteger a nova velha Casa Branca.
Trump foi um grande acidente
no caminho da agenda globalista, das elites mundiais e do country club do
Partido Republicano
O primeiro dia do governo
Biden foi cheio de mais do mesmo. A mesma e velha hipocrisia do combo
Democratas/Mídia, que viu várias cidades serem destruídas, que ignorou por
completo a violência imposta pelos grupos Antifa e Black Lives Matter, que
chamou milhões de norte-americanos de genocidas por questionarem o lockdown e
o uso de máscara, agora perdeu a vergonha de vez (se é que ainda tinha alguma).
Jen Psaki, nova assessora de
imprensa da Casa Branca, foi questionada na quinta-feira por que Joe Biden e
membros de sua família não usavam máscara no Lincoln Memorial, logo depois de o
presidente ter assinado uma ordem executiva para o uso do protetor facial em
toda e qualquer propriedade federal. A resposta? “Ele estava comemorando um dia
histórico em nosso país… Temos coisas maiores com que nos preocupar.”
Imaginem, apenas imaginem, se
qualquer pessoa ligada à administração Trump respondesse dessa maneira.
E foi também já no primeiro
dia de governo Biden que 17 ordens executivas foram assinadas. Entre elas, a
volta à Organização Mundial da Saúde e ao acordo climático de Paris, e a
revogação da licença para construir o oleoduto Keystone, um projeto de US$ 8
bilhões que ligaria Alberta, no Canadá, ao Texas, nos Estados Unidos, e
ajudaria a América do Norte a manter sua independência energética. A decisão de
Biden pode levar o país de volta à dependência de mercados estrangeiros de
energia controlados pela Opep e outros cartéis de petróleo. O primeiro-ministro
do Canadá, Justin Trudeau, alinhado ideologicamente com as atuais políticas climáticas
dos democratas, criticou o colega norte-americano por revogar a licença que
encheria os cofrinhos canadenses de dólares norte-americanos. A canetada
democrata também extingui 11 mil empregos gerados diretamente pelo projeto, e
outros 60 mil serão perdidos indiretamente com postos relacionados à indústria.
Outra declaração nas primeiras
24 horas do governo Biden deixou muitos cidadãos de cabelo em pé, mas agradou
aos senhores das armas e das guerras na velha Casa Branca e no Pentágono. O
novo presidente e velho político já considera enviar mais tropas para o Iraque,
depois que Donald Trump, cumprindo uma promessa de campanha, trouxe mais de
2.500 soldados de volta para os EUA.
O mais incrível dessas
primeiras 24 horas sob nova direção: não houve por parte da imprensa uma
pergunta sequer ao novo morador da Casa Branca sobre suas ordens executivas,
algumas já controversas e envolvendo vizinhos e aliados. Metade do país já
pergunta se haverá algum espaço ou vontade da velha mídia para críticas quando
o novo governo cometer algum erro, ou se os atuais militantes travestidos de
jornalistas correrão para suas redações e estúdios para justificar os
“equívocos bem-intencionados” do velho político da velha Casa Branca.
Um novo governo na maior
potência mundial — até aqui — se inicia. Jamais torceremos contra a América e a
sustentação de seu firme farol apontado para a liberdade, que mesmo em tempos
obscuros se mantém firme. A América não é perfeita e sua história mostra isso,
mas ela nasceu de bravos e corajosos homens que, como todos nós, também eram
imperfeitos. Até Pais Fundadores que estiveram juntos na Guerra Revolucionária
cortaram relações por causa de divergências políticas. John Adams, o segundo
presidente norte-americano, perdeu sua reeleição para Thomas Jefferson e, assim
como Donald Trump, não compareceu à posse de seu sucessor. Passaram anos sem se
falar. No decorrer da história, já aposentados e em suas propriedades,
começaram a trocar cartas e durante anos reavivaram o que os unia. O amor pela
pátria. Morreram no mesmo dia, 4 de julho de 1826, quando a Declaração de
Independência, escrita por Jefferson, completava 50 anos.
Provavelmente seria romantizar
demais uma reaproximação da velha política e da velha mídia com os velhos
valores que ainda sustentam a base genética norte-americana. Durante sua vida e
seu governo, Donald Trump também cometeu erros. Talvez alguns tons da
sagacidade de Adams ou da diplomacia de Jefferson tivessem ajudado durante sua
administração, mas o fato é que, mesmo como um elefante numa loja de cristais,
ele deixou um legado significativo. Bateu de frente com o globalismo, colocou a
América em primeiro lugar para os norte-americanos (America First) e
trouxe de volta um velho tripé que andava meio sumido. O tripé dos “Ps”, estabelecido
por Ronald Reagan em seus oito anos de Casa Branca: paz, patriotismo e
prosperidade. Trump foi um grande acidente no caminho da agenda globalista, das
elites mundiais e do country club dentro do Partido
Republicano, e por isso é necessário apagá-lo até da vida digital.
Apesar da apreensão de milhões
de norte-americanos diante da agenda ideológica da extrema esquerda de Joe
Biden, a agenda econômica preocupa muito a todos os que entendem que o caminho
sempre em direção à liberdade foi exatamente o que permitiu a prosperidade.
Apesar das incertezas de um presidente que passou toda a sua campanha trancado
no porão de casa, e de que o interrogatório pela mídia agora será sobre seu
sabor favorito de milk-shake ou sobre suas meias fashion,
o legado de Trump, que vai além dos números econômicos e dos acordos de paz
assinados, ainda pode surpreender.
A história mostra que, mesmo
durante momentos turvos e desconexos, os Estados Unidos sempre reagiram. Não
será diferente agora. Trump foi imprevisível para nós, mas foi ainda mais
imprevisível para todos eles. A velha Casa Branca está de volta. Mas lá fora,
nas ruas, a velha conexão com os valores que o Ocidente busca — e precisa —
conservar foi restabelecida. A reafirmação daquilo que realmente amamos e que,
hoje, vemos mais claramente que é parte essencial da sobrevivência das raízes
ocidentais e de todos nós não vai a lugar algum. O elefante, por muitas vezes
desajeitado, não tem ideia de quantos cristais quebrou, mas o barulho, ainda
bem, acordou muita gente.
Título e Texto: Ana Paula Henkel, revista Oeste, nº 44, 22-2-2021
https://www.caoquefuma.com/2021/01/a-nova-velha-casa-branca.html#more
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