Congresso avalia reduzir poder de governadores sobre PM e Polícia Civil
O Congresso se prepara para votar dois projetos de lei orgânica das polícias civil e militar que restringem o poder de governadores sobre braços armados dos estados e do Distrito Federal, destaca o Estadão. As propostas trazem mudanças na estrutura das polícias, como a criação, na PM, da patente de general, hoje exclusiva das Forças Armadas,e a constituição de um Conselho Nacional de Polícia Civil ligado à União.
O novo modelo é defendido por aliados do governo no momento em que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) endurece o discurso da segurança pública para alavancar sua popularidade na segunda metade do mandato. Os projetos limitam o controle político dos governadores sobre as polícias ao prever mandato de dois anos para os comandantes-gerais e delegados-gerais, e impor condições para que eles sejam exonerados antes do prazo. No caso da
Polícia Militar, a sugestão é para que a nomeação do comandante saia de uma lista tríplice indicada pelos oficiais. O texto prevê que a destituição, por iniciativa do governador, seja “justificada e por motivo relevante devidamente comprovado”.
Na Polícia Civil, o delegado-geral poderá ser escolhido diretamente pelo governador entre aqueles de classe mais alta na carreira. A dispensa “fundamentada”, porém, precisa ser ratificada pela Assembleia Legislativa ou Câmara Distrital, em votação por maioria absoluta dos parlamentares.
Autonomia
Os textos foram obtidos pelo Estadão. Esses mecanismos são vistos nas polícias como forma de defesa das corporações contra ingerência e perseguição política. Estudiosos do tema alertam, no entanto, que o excesso de autonomia administrativa e financeira – e até funcional, como proposto para as PMs – pode criar um projeto de poder paralelo. A avaliação é que, dessa forma, os governadores se tornam “reféns” dos comandantes. O sociólogo Luis Flávio Sapori, da PUC-MG (Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais), considera que as propostas estão em “sintonia ideológica” com o governo Bolsonaro. “É um retrocesso o que está para ser votado no Congresso e a sociedade brasileira não está sabendo. São acordos intramuros. O projeto está muito de acordo com a perspectiva do governo Bolsonaro.
Há um alinhamento ideológico claro pela maior militarização e maior autonomia das polícias militares em relação ao comando político”, disse Sapori.
Simetria
Pela proposta, a PM passaria a ter uma estrutura hierárquica equivalente às Forças Armadas. Haveria, assim, três níveis de oficiais-generais: o mais alto seria o tenente-general, seguido do major-general e do brigadeiro-general. Atualmente, a hierarquia das PMs vai até os oficiais-superiores e a patente no topo é a de coronel.
Uma das organizações consultadas para a elaboração do projeto de lei, a Feneme (Federação Nacional de Entidades de Oficiais Militares Estaduais e do Distrito Federal) argumenta que a similaridade deve existir porque os policiais e os bombeiros militares constituem a força auxiliar e reserva do Exército. A legislação das polícias é de 1969 e, de acordo com a Feneme, as leis
aprovadas nos Estados – sem uma padronização nacional – acabam desfigurando as polícias por “interesses particulares”.
Apesar da restrição da liberdade de escolha e de demissão sugerida, a entidade alega que os governadores não perdem autonomia sobre a PM, que continua vinculada aos Estados, e que não há no projeto de lei “nenhuma premissa ideológica ou partidária”.
O Palácio do Planalto vem sendo consultado e chegou a dar sugestões para os projetos de lei orgânica desde a gestão do ex-ministro da Justiça Sergio Moro. Questionado sobre o apoio político aos projetos, o atual titular da Justiça e Segurança Pública, André Mendonça, disse que “os pontos de discussão encontram-se sob análise”. O ministério confirmou ao Estadão que foram realizadas reuniões com conselhos nacionais, associações e sindicatos das polícias estaduais para discutir e receber sugestões ao texto.
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Bandeira
Na eleição de 2018, Bolsonaro, que é capitão reformado do Exército, encampou o discurso de endurecimento na segurança pública e valorização de policiais, uma plataforma de campanha que também impulsionou a representação da classe no Legislativo.
No ano passado, um motim de PMs no Ceará expôs a politização latente próBolsonaro entre policiais militares. O movimento grevista ilegal não foi condenado pelo presidente e ocorreu contra um governo de esquerda, de Camilo Santana (PT), que denunciou a “partidarização” nos batalhões. Em agosto, uma pesquisa do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e da empresa de inteligência digital Decode identificou que 41% dos praças das PMs interagiam em ambientes virtuais bolsonaristas no Facebook e 25% deles ecoavam ideias radicais.
Impasses
Dos projetos que preveem mudanças nas polícias, o mais adiantado é o das PMs. O relator do projeto é o deputado Capitão Augusto (PL-SP), líder da bancada da bala no Congresso – que reúne cerca de 300 parlamentares – e aliado do governo. Ele ainda não apresentou formalmente o relatório na Câmara. Havia acordo com o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para votá-lo ainda no ano passado, mas a pandemia e as eleições municipais adiaram a pauta. Além disso, falta consenso sobre parte das mudanças previstas, entre elas a padronização nacional de viaturas e uniformes.
Capitão Augusto admite que seu texto ainda deve passar por mudanças. O deputado apontou, por exemplo, a resistência da PM de Minas Gerais em adotar um fardamento padrão e a contrariedade da PM de São Paulo em exigir curso superior para ingresso na corporação.
Em algumas praças, há diferentes critérios de promoção e os PMs conseguiram benefícios no plano de carreira similares ao dos servidores estaduais. Se alterados por uma lei orgânica de alcance nacional, esse grupo poderia sair prejudicado.
“Falta aparar algumas arestas para ter o texto pronto, mas, se não tiver consenso, vou pedir para pautar da mesma forma. A gente retira o que não tem acordo e aprova-se o resto”, disse Capitão Augusto. “Desde a Constituição, faz 32 anos que estamos aguardando uma lei orgânica básica.”
Mudanças
Polícia Militar e Corpo de Bombeiros
- Comandante-geral passa a ter mandato de 2 anos, indicado por lista tríplice ao governador; destituição deve ser “justificada e por motivo relevante devidamente comprovado”.
Cria o quadro de oficiais-generais formado por três patentes, nesta ordem hierárquica: tenente-general, major-general e brigadeiro-general.
Estabelece como competências da PM credenciar e fiscalizar empresas de segurança privada, atualmente uma tarefa da Polícia Federal.
Polícia Civil
– Delegado-geral passa a ter mandato de 2 anos; só pode ser exonerado por ato fundamentado do governador, ratificado por maioria absoluta dos deputados estaduais ou distritais.
- Proíbe a divulgação de técnicas de investigação utilizadas pelas polícias civis
e de qualquer dado ou informação decorrente de quebras de sigilo. Cria o conselho Nacional de Polícia Civil, formado por parlamentares, delegados, agentes, sindicalistas, representantes do ministro da Justiça e Segurança Pública e da OAB.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo
Fonte: UOL
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