Para militares de Bolsonaro, STF já foi longe demais


Ka Ferriche

“Um deboche”. Esse foi o comentário reservado entre os militares que ocupam hoje espaços no Palácio do Planalto, sobre a decisão de desempate de Dias Toffoli que, somada a de outros cinco ministros do Supremo Tribunal Federal, feriram de morte a Operação Lava Jato. Há uma nervosa movimentação no polígono da Esplanada dos Ministérios neste momento. Instalados na Praça dos Três Poderes, estão equidistantes o Congresso Nacional, o Palácio do STF e o Palácio do Planalto. A distância que os separa, só para servir de referência espacial, não chega a ser a metade do que percorre uma bala de fuzil para atingir o alvo com precisão. Ou seja, embora fisicamente muito próximos, estão separados sobre o que pensam e arbitram pelo futuro do Brasil.

A deputada federal Joice Hasselman (PSL-SP) já disse que sairá em defesa da aplicação do Artigo 142 da Constituição contra a instituição que abriga os ministros odiados pelo Palácio do Planalto e por grande parte das bancadas no Senado e na Câmara. A diferença destes dois poderes para a instância superior da Justiça é a metodologia de ingresso para ocupar suas cadeiras. O Executivo e o Legislativo exigem concurso público, por meio de eleições diretas. Os 11 postos do STF, entretanto, são ocupados por pessoas indicadas pelo presidente da República.

A composição atual abriga a maioria de nomes indicados pelo presidiário Lula e pela impedida Dilma Rousseff. Para ser supremo ministro não há concurso público, nem provas nem eleições. Hoje é discutida entre as autoridades a legitimidade daqueles magistrados. O que diz o Artigo 142: que as Forças Armadas “são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”.

E fornece mais munição. O parágrafo segundo do Artigo 15 da Lei Complementar nº 97, de 1999, reforça: “A atuação das Forças Armadas, na garantia da lei e da ordem, por iniciativa de quaisquer dos poderes constitucionais, ocorrerá de acordo com as diretrizes baixadas em ato do Presidente da República, após esgotados os instrumentos destinados à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, relacionados no Art 144 Constituição Federal.”

Um dos algozes da Lava Jato, ministro Ricardo Lewandowski, segundo os defensores de uma intervenção no STF, já legitimou quaisquer interpretações que venham a ser feitas pelo Planalto sobre a lei magna. Foi ele responsável pelo entendimento de que Dilma seria atingida pelo impeachment, mas não seus direitos políticos, o que é contraditório e inédito. Outros ministros, entre eles o mais ousado, Gilmar Mendes, já forneceram dezenas de motivos para que a Constituição seja interpretada pela conveniência de quem decidir utilizá-la.

Apoiadores midiáticos de Bolsonaro, como Olavo de Carvalho, vivem afirmando que os ministros generais de Bolsonaro mijam nas calças quando estão diante da grande imprensa marrom. Ninguém entendeu ainda o papel de Carvalho que filosofa e faz pressão, apoia a nomeação de sua preferência para ocupar ministérios e depois desaconselha seus pupilos, sugerindo abandonar o governo. Enquanto, dizem, faz vaquinha eletrônica para poder pagar seu breakfast em terras estadunidenses onde reside, regado a pancakes, eggs e porridges.

Entendem os críticos do crítico que ele julga tardia a intervenção no STF, após as sucessivas decisões daquele colegiado com impacto estratosférico na vida do cidadão comum, mas que é impaciência de quem está distante, confortavelmente instalado em Miami ou arredores.

Fontes palacianas, conhecedoras do perfil dos generais distribuídos em seus ministérios, afirmam que a assessoria fardada de Bolsonaro sabe muito bem o que está fazendo. São reconhecidos estrategistas e costumam dizimar inimigos. Consideram a apertada votação da Suprema Corte, além de um desastre, um ato falho e derradeiro. Muitos mortais comuns não entendem onde os ministros do STF contrários às punições dos delinquentes da Lava Jato, encontram garantia de segurança ao desafiar a maioria da sociedade que já perdeu a paciência com eles, conforme amostragem nas redes sociais. Será que solicitarão garantias ao Palácio do Planalto?

Um aspecto curioso foi o aumento e a agressividade sobre aqueles magistrados nos meios eletrônicos, após Toffoli editar portaria ameaçando os cidadãos que tornassem públicas as suas indignações, inclusive a bordo de aeronaves. Terá que investigar e punir milhões de internautas. E quem vai prendê-los? Outros entusiastas de uma intervenção no STF são inspirados no episódio do Peru, que cassou em 2018 sua Suprema Corte, quando foram reveladas gravações em que suas autoridades máximas do judiciário prevaricavam defendendo interesses escusos.

No Brasil não chegamos a tanto até agora. Não existem provas que acusem os ilibadíssimos ministros do STF de comportamento escuso. Por enquanto, eles apenas discordam politicamente da maioria da população. Por enquanto, estão no exercício de interpretar a Constituição como bem entenderem, até que completem 75 anos. Por enquanto, as autoridades do Planalto e os congressistas apenas aceleram seus batimentos cardíacos a cada decisão do STF.

A pergunta mais frequente e sussurrada na Praça dos Três Poderes continua a ser onde aqueles ministros depositam sua segurança, garantia de cumprimento de suas decisões, certeza de que suas vidas não serão reviradas ao avesso. Ficam no ar dúvidas que só terão respostas quando o próximo movimento do tabuleiro for dado. Como no xadrez, não há prazo. As más línguas dizem que a desobediência institucional, com a reconhecida e não menos debochada sutileza nacional, já esta em curso.

Entre as providências, o Palácio do Planalto poderá requisitar os sete Boeing 737 Max 8 da Gol para transportar líderes do tráfico e algumas autoridades, na falta de jatinhos da FAB. Alguns já fizeram check in, dizem. Questão de economia, apenas.


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