‘Reforma da Previdência dos militares’: acirram-se as contradições no seio do Exército Brasileiro


Comandante do Exército reacionário, general Pujol, cumprimenta o presidente fascista Bolsonaro. Foto: Marcos Corrêa/Presidência da República
O Projeto de Lei (PL) 1645/2019, apresentado no dia 20 de março deste ano, vem escancarando uma histórica contradição existente no seio das reacionárias Forças Armadas. Tal PL, chamado também de “reforma da Previdência dos militares”, assegura ainda mais os privilégios do alto escalão do Exército em detrimento das patentes mais baixas e dos graduados.
O Poder Executivo, sob a chefia de Jair Bolsonaro, é o responsável pelo projeto, elaborado junto aos generais. Segundo o Ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, tal reforma é importante “na valorização dos militares”, pois a “disponibilidade permanente e dedicação exclusiva” têm de ser “recompensadas e reconhecidas pela sociedade e pelo parlamento”. Tal demagogia, entretanto, esconde um vasto leque de adicionais e concessões a altos militares já pertencentes à fração dominante da força.
A ‘unidade’: privilégios aos generais
O primeiro dos privilégios está na concessão da gratificação de representação apenas para generais (ou demais oficiais em alguma posição de comando), presente no artigo 9 do projeto. 
“Art. 9º A gratificação de representação é parcela remuneratória devida: I - aos oficiais-generais; e II - em caráter eventual, conforme regulamentação: a) aos oficiais em cargo de comando, direção e chefia de organização militar; b) pela participação em viagem de representação ou de instrução; c) em emprego operacional; ou d) por estar às ordens de autoridade estrangeira no País.” 
Outro privilégio aos altos mandos militares, presente no “Anexo III” da “Tabela de Adicional de Habitação” do projeto, é o aumento percentual gradativo de Adicional de Habilitação sobre o soldo. Isto significa que, ao final de quatro anos, a categoria considerada de “Altos Estudos 1” (oficial-general, coronel e subtenente) terá um aumento de 73% do salário. Por outro lado, à categoria de “Formação” (segundo-tenente, terceiro-sargento, cabo e soldado), tal adicional representará um incremento de 12% no mesmo período.
Esses são apenas alguns exemplos da garantia de “regalias” à alta oficialidade e generalato já bem remunerados, em contraposição ao resto da tropa. Vale lembrar que a maior parte do alto escalão do Exército é composto de membros das classes dominantes (latifundiários ou grandes burgueses), ao passo que a baixa oficialidade e a graduação integram pessoas de rendas mais baixas.
Compra de votos?
Conforme denunciado pela própria revista “Sociedade Militar”, reacionária e ligada a setores da baixa oficialidade, os reacionários generais, oportunisticamente, passaram a condecorar deputados, incluindo o relator da proposta, na tentativa de facilitar a aprovação do PL. 
“O que tem gerado mais indignação nos últimos dias foi o fato do Comandante do Exército [Edson Leal Pujol] ter concedido condecorações para o relator do PL-1645 às vésperas de sua apreciação pela Comissão da Câmara de Deputados. Para muitos a coisa é criminosa e/ou seria improbidade administrativa por se configurar como uso da máquina pública em benefício próprio”, critica a revista da extrema-direita militar. “Com as condecorações da semana passada o número de parlamentares da comissão que apreciam o PL-1645 e que foram condecorados pelas Forças Armadas já ultrapassa 30% do total”.
Baixas patentes se agitam e crise militar se eleva
Tal aumento de privilégios, assim que foram anunciados, promoveram uma agudização das contradições dentro das Forças Armadas, especialmente do Exército, culminando em manifestações, protestos, notas de repúdio e outras formas de rechaço por parte da baixa oficialidade aos generais. 
Conforme noticiado pela já citada revista: “Os graduados das Forças Armadas – debaixo de chuva – no Rio de Janeiro se manifestam contra itens do PL-1645, que privilegiam oficiais generais e carreiras mais no topo da estrutura hierárquica”. 
Vários militares de baixa patente vêm denunciando tal PL como um verdadeiro “golpe contra sua dignidade”.  De acordo com um suboficial da Marinha, citado anonimamente pela revista: “Se todos por lei representam as Forças Armadas – fato que usam inclusive para ameaçar de punição militares da reserva que se unem para pleitear mudanças no projeto de lei, sendo este um direito constitucional – porque querem criar uma gratificação de representação só para oficiais generais até na reserva?”.
Outros grupos ainda são afetados pela proposta. O deputado Capitão Augusto, presidente da “Frente Parlamentar da Segurança Pública”, criticou o fato dos policiais militares e bombeiros terem direitos civis limitados, como a impossibilidade de organizar greves, e ao mesmo tempo serem enquadrados como civis no que concerne à Previdência, visto que não são amparados pelo PL-1645: “Estamos pedindo o mínimo. Se for para nos tratar como civis, eu vou querer os mesmos direitos. Só quero greve e sindicato”, disparou o reacionário, demonstrando que a crise militar se estende às polícias militares.
Alta oficialidade: casta burocrático-feudal
Os privilégios das altas patentes não surgiram, obviamente, desse PL: em verdade, remontam à tradição histórica, aristocrática e feudal do sistema vigente em nossa nação. Desde sua fundação, na Guerra da Independência em 1822, e sua posterior organização, na Guerra do Paraguai em 1864, o Exército sempre teve seus altos mandos militares ocupados pelas oligarquias rurais (posteriormente pelos grandes burgueses urbanos).
Isso se mantém atualmente, inclusive por tradição oligárquica familiar, de manutenção do poder. A família Theófilo Gaspar de Oliveira tem militares que remontam desde o I Império, se mantendo até os dias atuais, com cinco irmãos, dois deles generais, como o General Manoel Theophilo Gaspar de Oliveira. A família Mourão (representada pelo vice de Bolsonaro) não escapa da tradição, com o pai do general Hamilton Mourão, que possui o mesmo nome, sendo um general de divisão da reserva. Há inúmeros outros casos que podem ser citados: os antigos proprietários de terra, por meio de seu poder político, foram garantindo os privilégios de seus descendentes por meio de patentes de altos oficiais. 
Ainda hoje, os filhos de militares, especialmente de altos mandos, têm garantia de vaga para ingressarem em colégios militares e, ao se formarem, já possuem toda a preparação prévia para a realização de provas de oficialidade (como da Academia Militar das Agulhas Negras). Por outro lado, a majoritária gama de praças são filhos do povo, de proletários, e não têm qualquer chance de ascenderem a patentes mais altas. 
Conforme denunciado pelo procurador Alexandre Gavronski, tais colégios “são montados para atender a filhos de militares. Todo ano é feito concurso público somente para as vagas que sobram. Isso não é direito. Isso é privilégio”.
Assim, o acirramento dessas contradições é reflexo da crise estrutural pela qual passa o velho Estado brasileiro. Os reflexos da semifeudalidade em toda a sociedade – incluindo no Exército – continuarão a se manifestar.

Bibliografia:



https://anovademocracia.com.br/noticias/11804-reforma-da-previdencia-dos-militares-acirram-se-as-contradicoes-no-seio-do-exercito-brasileiro

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