Deputado do PTB fazia manobras políticas em favor do próprio negócio
Murilo Fagundes e Renato Souza
Correio Braziliense
Acusado
pelo Ministério Público Federal (MPF) de envolvimento em um esquema de fraudes
na emissão de registros sindicais no Ministério do Trabalho, o deputado Nelson
Marquezelli (PTB-SP) coleciona polêmicas. Ele figura como um dos sócios da
empresa Brapira Comércio de Bebidas, que presta serviço de transporte de cargas
e tem cerca de 120 caminhões. Ao mesmo tempo, o parlamentar atuou como relator,
até o mês passado, de um projeto de lei que regulamenta o transporte rodoviário
de cargas em todo o território nacional e beneficia empresas do setor.
De
acordo com dados da prestação de contas das eleições de 2014, levantados pelo
Correio por meio dos registros do Tribunal Superior Eleitoral, Marquezelli
recebeu R$ 1,08 milhão em doações de campanha da própria empresa.
PROIBIÇÃO –
O Código de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara proíbe que deputados façam a
relatoria de projetos de “interesse específico de pessoa física ou jurídica que
tenha contribuído para o financiamento de sua campanha eleitoral”. Além da
Brapira, o parlamentar também recebeu aporte financeiro eleitoral de uma
associação que representa donos de empresas de transporte.
O
próprio Marquezelli, como pessoa física, injetou R$ 900 mil na própria
campanha. Não é de hoje que o parlamentar faz lobby em detrimento das
corporações que atuam no serviço de transportes de cargas. Em abril de 2014,
reportagem do Correio flagrou um grupo de 30 pessoas recebendo notas de R$ 20 e
R$ 50 para ocupar as galerias da Câmara em defesa de projeto de ampliação da
jornada de caminhoneiros. A distribuição de dinheiro foi registrada em vídeos e
fotos. A entrega do dinheiro começou na chapelaria do Congresso e, de acordo
com a reportagem da época, ocorreu até no gabinete do deputado, no Anexo IV da
Câmara.
FOI RELATOR –
O “PL 4860/2016”, do qual Marquezelli foi relator durante vários meses, previa
normas para regulação do transporte rodoviário de cargas em território
nacional. Uma das medidas seria a obrigatoriedade do poder público construir
locais de parada e descanso de prestadores de serviços para empresas de
transporte de cargas e condutores autônomos de caminhões, em caso da falta de
interesse no serviço por parte de empresas privadas.
O
PL tramitou até o dia 20 de junho deste ano, quando foi considerado prejudicado
por conta da aprovação no plenário da casa de mudanças no Código de Trânsito
Brasileiro (CTB).
EM CAUSA PRÓPRIA –
O professor Samuel Santos, especialista em direito penal, eleitoral e
previdenciário — falando de forma genérica —, destaca que parlamentares não podem
atuar em projetos legislativos que possam ter algum tipo de benefício. Caso
isso ocorra, a lei aprovada por conta do projeto pode ser alvo de ações na
Justiça.
“O
parlamentar deve basear sua atividade no princípio da moralidade. Atitudes de
deputados em relatar projeto que pode beneficiar a empresa viola o código de
ética e a impessoalidade no processo legislativo. Caso vire lei, as regras
podem ser questionadas por meio de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade
(ADI), apresentada ao Supremo Tribunal Federal (STF).”
ENVOLVIMENTO –
De acordo com o Ministério Público Federal (MPF), o deputado Nelson Maquezelli
é suspeito de envolvimento no esquema de concessões irregulares de registros
sindicais pela Secretaria de Relações do Trabalho. O gabinete dele foi alvo de
buscas pela Polícia Federal e, por determinação do ministro Edson Fachin, do
Supremo Tribunal Federal (STF), o parlamentar está impedido de frequentar e
manter contatos com servidores do Ministério do Trabalho e demais investigados.
O
assessor dele, Jonas Antunes Lima, também é investigado. As equipes policiais
encontraram R$ 95 mil em espécie no apartamento dele, e outros R$ 5 mil no
gabinete do deputado. O parlamentar disse que apoia a operação e negou estar
envolvido em atos ilícitos. “Vamos esperar a investigação. A gente sabe
perfeitamente que esse é um trabalho que deve ser feito e esclarecido para a
população. Nada a temer”, afirmou.
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